Queimadas no Brasil: o que os agricultores podem fazer
Engenheiro florestal fala sobre segurança e os aspectos técnicos dessa situação. Confira as orientações e medidas de prevenção!
Engenheiro florestal fala sobre segurança e os aspectos técnicos dessa situação. Confira as orientações e medidas de prevenção!
Um ano com um volume de queimadas altíssimo no Brasil. Segundo o Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), 2024 já é considerado um dos anos com a maior quantidade de focos da última década, tendo o maior número desde 2010. Só o mês de setembro contabilizou mais de 80 mil focos de incêndio, o que significa 30% acima da média histórica registrada desde 1998.
O levantamento do Inpe indica ainda um aumento consistente nos focos em todas as regiões do país, em relação a 2023, com destaque para o Centro-Oeste: Mato Grosso do Sul, com 601% focos a mais em 2024, Distrito Federal, com 269%, e Mato Grosso, com 217%, tornando-se a região com o maior número de focos de incêndio no país neste ano.
Neste contexto desafiador, conversamos com Neder Maciel Corso, engenheiro florestal técnico do Sistema FAEP (Federação da Agricultura do Estado do Paraná). Em bate-papo com a Brevant® Sementes, ele destacou a importância da busca por segurança na propriedade, da proteção para manter a umidade do solo, o que fazer em caso de incêndio (aceiro), e como recuperar a área atingida. Saiba mais na entrevista a seguir:
Neder Maciel Corso - A recomendação da Federação da Agricultura do Estado do Paraná para os produtores rurais é de que eles só se envolvam no combate direto aos incêndios florestais em casos de princípios de incêndio. Conforme o incêndio se alastre, nossa recomendação é que o produtor não tente combater o fogo sozinho. A dica principal é procurar um local seguro, inclusive para sua família, avisar os vizinhos e acionar o Corpo de Bombeiros do seu estado. Também é importante, se ele tiver a informação, que denuncie um incêndio criminoso, acionando a Polícia Ambiental de cada região.
Se o produtor já tiver sido capacitado para o combate aos incêndios florestais (ou pelo menos tiver conhecimento e experiência) e se a propriedade possuir equipamentos adequados, aí é possível contribuir no combate direto, mas sem deixar de acionar os bombeiros em qualquer circunstância. De qualquer forma, a melhor dica que podemos dar com relação aos incêndios florestais é a prevenção, pois em um incêndio de grandes proporções a principal recomendação é em relação à sua própria segurança e a de seus familiares.
Neder Maciel Corso - Há medidas que os produtores rurais podem adotar para evitar os incêndios ambientais ou, ao menos, reduzir seu potencial de dano. São elas:
1- Realize manutenção regular dos aceiros (faixas limpas de vegetação muito comuns em cultivos florestais de pinus e eucaliptos que também seriam recomendadas para o entorno de lavouras, com potencial ou histórico de sofrerem com o fogo).
2- Mantenha seu maquinário (veículos pipa) e equipamentos de combate como abafadores, enxadas, rastelos/ancinhos e mangueiras em perfeitas condições de uso.
3- Elimine toda a vegetação seca, arbustos e materiais inflamáveis que possam facilitar a propagação do fogo.
4- Ao capinar o terreno, recolha os montes imediatamente, pois são potenciais focos de incêndio.
5- Nunca inicie fogueiras, queime lixo ou use fogo em áreas de risco na propriedade.
6- Não solte balões e denuncie essa prática.
7- Não use fogo para limpar terrenos e trilhas.
Neder Maciel Corso - A dimensão da perda do produtor está diretamente ligada às características do incêndio, pois há casos, inclusive, de incêndios de solo, em situações de presença de muita matéria orgânica. Apesar de trazer consequências agronômicas negativas, não diria que os incêndios (fogo fora de controle) podem inutilizar por anos uma área de cultivo agrícola, como já fui questionado algumas vezes. Contudo, o agricultor deve ter ciência de que há um elevado custo envolvido para reverter os principais danos causados às áreas de cultivo: além da redução da fertilidade do solo (perda de macronutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio), os incêndios provocam alterações físicas (exposição direta à chuva, maior suscetibilidade à erosão) e biológicas (perda de microrganismos benéficos do solo) que comprometem diretamente a produtividade da lavoura.
Para o produtor que já teve lavoura comprometida é crucial que tome algumas medidas para restaurar os nutrientes e micro-organismos perdidos. Aqui estão algumas ações que podem ajudar:
1. Adição de matéria orgânica
• Composteira ou esterco: adicionar matéria orgânica como compostos orgânicos ou esterco bem decomposto pode melhorar a estrutura do solo e aumentar a presença de micro-organismos benéficos.
• Cobertura verde: plantar culturas de cobertura, como leguminosas (ex: mucuna, crotalária) ou gramíneas (ex: milheto), para ajudar a recuperar a matéria orgânica, fornecer nutrientes e proteger o solo.
2. Plantio direto e sistema de rotação de culturas
• Implementar o sistema de plantio direto para minimizar o revolvimento do solo, reduzir a erosão e manter a umidade.
• Realizar a rotação de culturas para ajudar na recuperação dos nutrientes do solo e diversificar a microbiota.
3. Correção do solo
• Análise de solo: realizar uma análise do solo para entender o impacto do fogo nos níveis de nutrientes e ajustar a fertilidade.
• Calagem e gessagem: corrigir a acidez do solo, se necessário, com a aplicação de calcário ou gesso agrícola, que também ajuda a melhorar a estrutura do solo.
4. Uso de micro-organismos benéficos
• Aplicar inoculantes microbianos (como bactérias fixadoras de nitrogênio) para acelerar a recolonização do solo.
• Utilizar biofertilizantes líquidos ricos em micro-organismos para auxiliar na recuperação biológica do solo.
5. Controle da erosão
• Utilizar práticas conservacionistas para evitar a erosão após o incêndio, como terraceamento, curvas de nível, faixas de vegetação e cobertura do solo.
• Plantar culturas de cobertura de crescimento rápido para proteger o solo exposto.
6. Adubação com nutrientes essenciais
• Fósforo e potássio: aplicar adubos minerais, especialmente fósforo e potássio, que podem ter sido perdidos ou volatilizados durante o incêndio.
• Micronutrientes: verificar a necessidade de micronutrientes como zinco, manganês e boro, que podem ter sofrido perdas significativas.
7. Recuperação da matéria orgânica do solo
• Plantar árvores ou arbustos fixadores de nitrogênio nas bordas da lavoura para ajudar a recompor a matéria orgânica.
• Realizar a adubação verde com plantas de ciclo curto que fixam nitrogênio e enriquecem o solo.
8. Irrigação adequada
• Se possível, utilizar a irrigação para manter a umidade adequada do solo, favorecendo a decomposição da matéria orgânica e o desenvolvimento de micro-organismos.
Essas práticas ajudam a restaurar a estrutura e fertilidade do solo e a criar condições para um novo ciclo produtivo, além de prevenir erosão e outras degradações após um incêndio.
Neder Maciel Corso - Em condições mais severas, de baixa umidade relativa do ar e temperaturas acima do normal (como a que estamos verificando nestes últimos meses), os incêndios florestais podem provocar prejuízos consideráveis, relacionados a perdas materiais, ambientais e até risco de morte (para animais silvestres e seres humanos). Entre os efeitos dos incêndios em áreas rurais, podemos citar a destruição de nascentes de água, redução da fertilidade do solo, acidentes com a rede elétrica, poluição do ar, que pode causar problemas de saúde como doenças pulmonares e alergias respiratórias.
Neder Maciel Corso - O Governo Federal está disponibilizando um crédito de R$ 6,5 bilhões para produtores rurais afetados por incêndios, por meio do Programa de Financiamento de Sistemas de Produção Agropecuária Sustentáveis (RenovAgro). O crédito é parte do Plano Safra 24/25 e está destinado à recuperação de áreas degradadas e incentivo à produção em terrenos afetados. É importantíssimo esse crédito, principalmente para os produtores que tiveram grandes prejuízos, pois eles precisarão de apoio - e não só financeiro, mas também técnico - para entenderem o que precisará ser priorizado.
Especificamente no Paraná, o Sistema FAEP/SENAR-PR é parceiro da Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal (APRE) e do Instituto de Desenvolvimento Rural (IDR-Paraná) na campanha “Unidos na prevenção aos incêndios florestais”, que conta com diversos parceiros como Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, Embrapa Florestas, IBAMA, Instituto Água e Terra (IAT), Simepar e Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Dicas - O engenheiro florestal técnico do Sistema FAEP indica aos agricultores de todo o país que busquem orientações e aprimoramento, uma vez que, “em condições de estiagem severa e calor excessivo, uma simples fagulha do motor de maquinário sem manutenção adequada, em contato com o capim seco, pode dar início a um princípio de incêndio”, exemplifica.
Nesse sentido, o SENAR-PR oferta cursos de prevenção e combate aos incêndios florestais/ambientais desde 2010, quando desenvolveu material didático em conjunto com professores do Departamento de Incêndios Florestais da UFPR e capacitou instrutores para atuar nas empresas de base florestal. Informações sobre o Curso de Incêndios Florestais aqui.
Após a pandemia, também em função de ter sido um ano crítico em relação aos incêndios ambientais, o SENAR-PR passou a ofertar cursos de prevenção e combate aos incêndios no meio rural. Neste treinamento há conteúdo relativo aos primeiros socorros, em função dos possíveis problemas de saúde e segurança envolvidos nas ocorrências de incêndios.
O produtor também pode acessar o manual de prevenção e combate aos incêndios florestais que está disponível na biblioteca virtual do Sistema FAEP para download.