Primeiramente, é preciso entender a diferença de imposto e contribuição. A contribuição apresenta um destino específico para o capital recolhido, ou seja, o governo não pode alterá-lo. Já para o imposto, não há destinação específica e é a principal fonte de ganhos para o setor público.
Ao final de 2022, uma série de projetos buscando ampliar as taxações ao agronegócio passaram a figurar no Brasil (Goiás, Paraná e Tocantins). Destacamos Goiás, onde o projeto já foi aprovado e entrará em vigor. Mais detalhes sobre o projeto serão abordados adiante.
Para melhor ponderar a respeito dessa nova ação pública, é necessário compreender algumas das principais taxas, fundos e impostos aos quais o setor do agronegócio está submetido.
O Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) é uma contribuição social de caráter previdenciário acometido na comercialização da produção rural. Ele é pago pelo produtor rural e é recolhido pela pessoa jurídica no momento da compra do produto, sendo descontado em cima do valor bruto da comercialização.
Apesar de ser considerado de caráter previdenciário, apenas a contribuição ao Funrural não garante o direito à aposentadoria, ou seja, é necessário contribuir para o INSS de forma individual, pois a contribuição se dirige para a previdência como um todo e não diretamente para a aposentadoria do produtor.
Em 2022, produtores rurais (pessoa física) pagaram a alíquota de 1,5% (1,2% INSS + 0,1% RAT + 0,2% Senar). Para produtores rurais (pessoa jurídica), a alíquota é de 2,05% (1,7% INSS + 0,1% RAT + 0,25% Senar). Já quem opta por recolher o Funrural pela folha de pagamento, paga uma alíquota correspondente a 20%.
O Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) é um tributo federal cobrado anualmente das propriedades rurais. O imposto é calculado com base no tamanho da propriedade e seu grau de utilização, sendo que, para grandes extensões de terra, o imposto é maior, e, quanto mais produtiva, o imposto é menor.
Parte do valor arrecadado vai para o Orçamento da União e outra parte é destinada aos municípios onde ficam localizadas as propriedades.
Exemplos de valores do ITR a ser pago (em % do valor da terra nua tributável): pequena propriedade com produtividade alta (0,03%); pequena propriedade ociosa (1%); grande propriedade com produtividade alta (0,45%) e grande propriedade ociosa (20%).
O ITR não incide sobre pequenas glebas rurais e alguns imóveis rurais compreendidos em programas oficiais de reforma agrária.
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é um tributo estadual. É um imposto cobrado de forma indireta, adicionado ao preço do produto comercializado ou serviço prestado.
O ICMS é uma das principais fontes de arrecadação dos estados, uma vez que incide tanto para pessoas físicas quanto jurídicas. Ele incide sobre a venda e transferência de produtos, transporte de bens, pessoas e valores entre municípios e estados brasileiros, importações de mercadorias, prestações de serviços externos e até mesmo sobre serviços de telecomunicação.
Cada estado tem sua própria tarifa, que gira em torno de 17 a 18%. Essa cobrança deve ser convertida para estado e município em serviços essenciais como segurança, saúde e educação.
No Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), a tributação é paga por empresas com CNPJ e é com base no lucro real, realizado a partir do Imposto de Renda, sendo sua cobrança de nível federal, ou seja, os estados ou municípios brasileiros não têm competência para exigir o tributo ou alterar as alíquotas do imposto.
Dependendo do regime tributário da empresa, o IRPJ poderá incidir sobre o faturamento ou sobre uma presunção do lucro.
Segundo a Constituição, 49% da arrecadação sobre o Imposto de Renda será distribuída pela União da seguinte forma: 21,5% ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal; 22,5% para o Fundo de Participação dos Municípios; e 3% para a aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Foi aprovado, em 17 de novembro de 2022, em primeira votação, em sessão ordinária da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), duas propostas formuladas pelo Executivo local, visando ampliar a contribuição a ser paga pelos produtores rurais goianos.
A segunda votação, prevista para acontecer em 22 de novembro, foi interrompida por manifestações contrárias à taxação. Com isso, uma nova votação foi realizada no dia seguinte (23), de forma remota, e aprovada com 61% dos votos.
Segundo o portal da Assembleia Legislativa de Goiás, o objetivo do projeto é instituir uma contribuição facultativa a um fundo destinado a investimentos em infraestrutura.
O projeto de lei n. 10803/22 visa criar o Fundo Estadual de Infraestrutura (Fundeinfra) enquanto, paralelamente, a proposição n. 10804/22 busca modificar o Código Tributário do Estado de Goiás.
Após a aprovação dos parlamentares, a decisão recai ao governador do estado, ficando a crivo do governador a sanção das leis.
Tendo em vista que os projetos em questão foram idealizados pelo próprio poder Executivo do estado, a tendência agora é de que ambos sejam validados nessa última etapa. A contribuição proposta, se aprovada, terá vigência nos quatro anos do governo que entrará em vigor (2023-2026).
De acordo com a ponta propositora, as taxações propostas pela nova normativa incidem apenas sobre produtores que recebem benefícios fiscais e terão perfil optativo. Desta forma, o produtor poderá escolher qual opção é mais viável.
No entanto, a não adesão à iniciativa pode impactar nas vantagens que essa classe de produtores recebe nos regimes especiais de tributação, sendo um dos pontos que causam insatisfação dos produtores e de parte dos deputados votantes.
A contribuição será de, no máximo,1,65%, incidindo, principalmente, sobre produtos como milho, soja, cana-de-açúcar, exportação de carnes e de minérios. O Governo goiano aponta que pequenos produtores, produtores da agricultura familiar e aqueles que produzem itens de cesta básica (arroz, feijão e leite, por exemplo) ficarão isentos da contribuição.
O Fundo de Infraestrutura do Estado deverá ser destinado exclusivamente a obras estaduais.
A tabela a seguir projeta quanto essa taxa representaria ao produtor em termos de custos financeiros sobre as culturas de soja e milho (tabela 1).
Tabela 1. Projeção da taxação, em R$, sobre a saca de soja, utilizando o preço médio da saca referente ao mês de dezembro* em Rio Verde/Goiás
* R$ 168,45/saca
Fonte: Scot Consultoria
Tabela 2. Projeção da taxação, em R$, sobre a saca de milho, utilizando o preço médio da saca referente ao mês de dezembro* em Rio Verde/Goiás
* R$ 71,27/saca
Fonte: Scot Consultoria
No Paraná, o projeto teria como cerne a angariação [1] de fundos por meio da produção agrícola e pecuária, sendo que cada produção terá sua alíquota. Será denominado Fundo de Desenvolvimento da Infraestrutura Logística do Estado (FDI-PR). A taxa incidirá em 14,95% sobre operações com o milho e 32,66% nas de soja.
No entanto, a proposta foi retirada de pauta após forte resistência de entidades do agronegócio.
A proposta não tornava obrigatória a contribuição de setores do agro ao fundo, mas era condicionante para que produtores recebessem o benefício de diferimento do ICMS em operações internas de alguns produtos.
No Tocantins, a Assembleia Legislativa aprovou o aumento da taxação sobre produtos agropecuários destinados à exportação. O percentual da contribuição era de 0,2% e agora passará a ser de 1,2%.
O reajuste deve incidir principalmente nos grandes produtores de commodities como soja e carne, porém exclui do recolhimento combustíveis líquidos ou gasosos, além de produtos como ovos e hortaliças.
O imposto arrecadado será direcionado para o Fundo Estadual de Transporte (FET), destinado a serviços de infraestrutura em pavimentação das rodovias estaduais.
Em Mato Grosso, já existe um projeto similar que está em funcionamento há 22 anos. Nele, o objetivo da contribuição ao longo dos anos foi destinar o orçamento recolhido para a construção e modernização do estado.
Nos últimos quatros anos, foram angariados R$ 5,65 bilhões com destinação, principalmente, à infraestrutura da região, pavimentação e restauração de rodovias, construção de pontes e manutenção das vias estaduais.
Goiás e Paraná inspiraram-se no estado mato-grossense e protocolaram projetos que visam taxar o agronegócio dentro de seu próprio estado, com o objetivo de, também, desenvolver a infraestrutura de sua região.
Em 2022, o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) diminuiu em Goiás. Os combustíveis foram os mais incididos por essa queda de captação do imposto, gerando um “buraco” na arrecadação do estado.
O fundo tem como premissa buscar diminuir o déficit de receita causado por essa redução. De acordo com o governo goiano, a redução do ICMS na comercialização de combustíveis e energia elétrica, entre outros, diminuirá em quase R$ 5 bilhões a arrecadação estadual anual e, com a nova taxação, a expectativa é de recolher aproximadamente R$ 700 milhões.
Essas novas propostas poderão impactar o agronegócio de diversas formas. Por um lado, é possível que o aumento das taxações possa gerar desincentivo para o produtor rural continuar na atividade.
Produtores, sindicatos e alguns parlamentares críticos às propostas apontam a taxação como ineficiente, uma vez que ela pode limitar o aporte dos produtores rurais que poderia ser destinado a investimentos na atividade, desestimulando a produtividade em um cenário em que muitos já sofrem com as altas dos custos de produção.
Defendem também que a contribuição não é fielmente facultativa, uma vez que aquele que optar por não aderir à taxação poderá perder seus incentivos fiscais, gerando um efeito indesejado sobre a indústria, o comércio e os serviços no estado.
Os fundos, porém, se bem assistidos, podem levar a uma melhora significativa na infraestrutura dos estados, investimento em tecnologias que invariavelmente ajudarão o produtor rural na logística e no escoamento de suas mercadorias.
Portanto, o importante aqui é ter a certeza de que, se aprovadas, essas novas normativas destinarão corretamente o dinheiro arrecadado, investindo efetivamente no que foi proposto.
O fundo goiano deverá contar com um Conselho Gestor, composto por representantes da gestão pública estadual e da iniciativa privada. O projeto visa também compor um Conselho Fiscal, composto por representantes da Secretaria de Economia, da Controladoria Geral do Estado e do setor privado, para acompanhar a captação e, principalmente, a correta aplicação desses recursos.
Referências
G1 – Portal de notícias da Globo
Portal da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego)
Site oficial do Governo Federal: Departamentos da Receita Federal e Planalto
Site oficial do Governo Municipal de Itaporanga/SE
Portal Tributário